Dia das Bruxas, e eu não poderia deixar a data subir na vassoura sem uma homenagem a mulheres que hoje teriam a fogueira como destino se ainda vivêssemos na Idade Média – período histórico que só não é o favorito de alguns homens porque, aparentemente, eles pretendem devolver a humanidade para o Paleolítico.
Pretendem mas talvez não consigam, já que o descaso deles com o aquecimento global pode tornar o planeta inabitável mesmo para os Flintstones. A esperança de que isso não ocorra são ativistas como Greta Thunberg, a sueca que sumiu do noticiário desde que trocou a defesa cosmética do meio ambiente por críticas contundentes ao principal motor de sua destruição: o capitalismo.
Sumiu, não; foi sumida, porque os donos do dinheiro (que são também os donos dos jornais) até toleram a reciclagem de garrafas, pneus, tampinhas, mas jamais tolerarão a reciclagem de um sistema que, ao priorizar o lucro deles, tem papel fundamental na extinção de florestas, rios, animais, ecossistemas inteiros que sustentam a vida.
Nesse contexto, uma jornalista que não repete o que os patrões querem ouvir merece ser reverenciada dia e noite. Eu me refiro a Flávia Oliveira, que não perde uma oportunidade de denunciar o quão injusto, misógino, racista e nocivo à natureza é esse modelo econômico que existe só para enriquecer ainda mais quem já tem bilhões na conta bancária.
Se mulher que é senhora da própria opinião incomoda ao cubo, mulher que é igualmente senhora do próprio corpo, do próprio desejo, da própria carreira, da própria fortuna incomoda ao infinito. Madonna, por exemplo. Quantas almas ressentidas não gostariam de ver a Inquisição recriada apenas para fazer da rainha do pop churrasco bem passado?
O azar dos trouxas é que musas como ela – que constroem uma obra capaz de atravessar, inspirar e unir gerações – jamais viram cinzas. Eu desconfio de que bebem regularmente uma poção que as mantém relevantes décadas após décadas. É o caso da quase centenária e ao mesmo tempo eterna Fernanda Montenegro. Não à toa, há poucos anos, a atriz foi escolhida para encarnar uma bruxa rodeada de livros prestes a ser incendiada, num ensaio fotográfico que se transformou em símbolo de resistência contra o obscurantismo.
Às Gretas, às Flávias, às Madonnas, às Fernandas, a cada Eunice que não descuida dos filhos, a cada Júlia que não abandona os pacientes, a cada Conceição que não desiste dos alunos, a cada Rebeca que não para a dança após a queda, a cada Marielle que não recua nem diante da violência dos poderosos – a todas vocês, minha fé e meu obrigado.
O mundo já teria acabado num caldeirão de maldades sem o seu condão de perseverar.